A greve e crise
O direito à greve e o respectivo exercício não devem nem podem ser encarados como datados, inúteis ou meras bandeiras políticas. Imperativo que tem menos por destinatários os grevistas, actuais ou potenciais, do que a imprensa, do que quem sofre os efeitos desse exercício e, enfim, do que a generalidade dos cidadãos.
As greves não são uma distracção, uns dias de férias sem retribuição e muito menos podem ser vistas como uma manifestação ou excesso de quem não quer fazer coisa alguma. Na verdade, a greve é o derradeiro instrumento, ao dispor dos trabalhadores, do equilíbrio das relações laborais e, por inerência, das relações sociais.
De forma mais ou menos assumida e mais ou menos enviesada, o discurso da crise arrasta sempre consigo a necessidade de paz social, necessidade que mais não é do que eufemismo para o melhor é estarem quietos que isto podia – e pode ainda vir a – ser pior. Convém que se tenha presente que nada disto é novo, que esse mesmo discurso acompanhou ciclicamente os (poucos) séculos da história das conquistas sociais.
O exercício do direito à greve não é de modo algum incompatível com uma conjuntura económica depressiva, nem com a modernização: antes lhes é conatural. De facto, é durante esses períodos que os empresários procedem à reponderação e reafectação dos diversos factores produtivos, sendo certo que as maiores mudanças se desenrolarão nos factores em que a sua realização se mostre mais fácil e menos dispendiosa. O mesmo é dizer que a primeira tentação é cortar na remuneração e demais acquis socio-económico dos trabalhadores. De uma perspectiva imediatista, estes cortes são os mais apelativos. Porém, as demais das vezes, não asseguram verdadeiramente a viabilidade da empresa. De qualquer forma, a legitimidade da contestação negocial, de que a greve é paradigma, vale por si mesma, não tendo de se fundear em argumentos de índole corporativa: cada conquista dos trabalhadores é um passo no sentido da justiça social e, enquanto tal, um passo para a humanidade.
A pressão decorrente da existência de uma alta taxa de desemprego, associada aos soundbites catastrofistas que ecoam por toda a imprensa, coloca os trabalhadores grevistas numa situação ingrata perante os seus concidadãos, traduzida por ditos análogos ao deplorável se não queres há quem queira. Como é bom de ver, nada melhor do que muitos desempregados e muitos trabalhadores em situação precária – contratação a termo, trabalho temporário, recibos verdes, imigrantes ilegais, enfim, situação tão polifórmica quanto a imaginação alcança - para que os trabalhadores normais sejam vistos como anormalmente privilegiados. A greve surge, pois, como um direito cujo exercício é cada vez mais difícil, porque socialmente pouco tolerado. O exemplo recente vivido no metropolitano de Lisboa é bem ilustrativo deste estado de coisas. Nada melhor do que fazer circular que parece que é por causa do contrato colectivo para convencer a generalidade das pessoas de que o que está em causa é um mero capricho dos trabalhadores e que alguém os devia pôr na ordem. O facto é que apenas com a manutenção desse contrato colectivo, ou com a negociação de um novo, não se registrará uma situação de retrocesso relativamente aos actuais e futuros trabalhadores daquela instituição. Felizmente, esta greve produziu efeitos, uma vez que parece haver agora disposição da Administração do Metropolitano para negociar a prorrogação do acordo de empresa. Infelizmente, é diminuto o relevo dado pela imprensa a este resultado. Esta gestão da informação tem por consequência a descredibilização do movimento sindical, desincentivando igualmente a participação social activa. E é nesta participação que se valida a democracia: a ausência daquela é tão ou mais forte sintoma da crise das instituições do que a tão propalada abstenção eleitoral.
Pm
As greves não são uma distracção, uns dias de férias sem retribuição e muito menos podem ser vistas como uma manifestação ou excesso de quem não quer fazer coisa alguma. Na verdade, a greve é o derradeiro instrumento, ao dispor dos trabalhadores, do equilíbrio das relações laborais e, por inerência, das relações sociais.
De forma mais ou menos assumida e mais ou menos enviesada, o discurso da crise arrasta sempre consigo a necessidade de paz social, necessidade que mais não é do que eufemismo para o melhor é estarem quietos que isto podia – e pode ainda vir a – ser pior. Convém que se tenha presente que nada disto é novo, que esse mesmo discurso acompanhou ciclicamente os (poucos) séculos da história das conquistas sociais.
O exercício do direito à greve não é de modo algum incompatível com uma conjuntura económica depressiva, nem com a modernização: antes lhes é conatural. De facto, é durante esses períodos que os empresários procedem à reponderação e reafectação dos diversos factores produtivos, sendo certo que as maiores mudanças se desenrolarão nos factores em que a sua realização se mostre mais fácil e menos dispendiosa. O mesmo é dizer que a primeira tentação é cortar na remuneração e demais acquis socio-económico dos trabalhadores. De uma perspectiva imediatista, estes cortes são os mais apelativos. Porém, as demais das vezes, não asseguram verdadeiramente a viabilidade da empresa. De qualquer forma, a legitimidade da contestação negocial, de que a greve é paradigma, vale por si mesma, não tendo de se fundear em argumentos de índole corporativa: cada conquista dos trabalhadores é um passo no sentido da justiça social e, enquanto tal, um passo para a humanidade.
A pressão decorrente da existência de uma alta taxa de desemprego, associada aos soundbites catastrofistas que ecoam por toda a imprensa, coloca os trabalhadores grevistas numa situação ingrata perante os seus concidadãos, traduzida por ditos análogos ao deplorável se não queres há quem queira. Como é bom de ver, nada melhor do que muitos desempregados e muitos trabalhadores em situação precária – contratação a termo, trabalho temporário, recibos verdes, imigrantes ilegais, enfim, situação tão polifórmica quanto a imaginação alcança - para que os trabalhadores normais sejam vistos como anormalmente privilegiados. A greve surge, pois, como um direito cujo exercício é cada vez mais difícil, porque socialmente pouco tolerado. O exemplo recente vivido no metropolitano de Lisboa é bem ilustrativo deste estado de coisas. Nada melhor do que fazer circular que parece que é por causa do contrato colectivo para convencer a generalidade das pessoas de que o que está em causa é um mero capricho dos trabalhadores e que alguém os devia pôr na ordem. O facto é que apenas com a manutenção desse contrato colectivo, ou com a negociação de um novo, não se registrará uma situação de retrocesso relativamente aos actuais e futuros trabalhadores daquela instituição. Felizmente, esta greve produziu efeitos, uma vez que parece haver agora disposição da Administração do Metropolitano para negociar a prorrogação do acordo de empresa. Infelizmente, é diminuto o relevo dado pela imprensa a este resultado. Esta gestão da informação tem por consequência a descredibilização do movimento sindical, desincentivando igualmente a participação social activa. E é nesta participação que se valida a democracia: a ausência daquela é tão ou mais forte sintoma da crise das instituições do que a tão propalada abstenção eleitoral.
Pm