Em favor das pequenas penas
E se Prometeu não tivesse sido propriamente agrilhoado ao monte Éfeso, mas tivesse ficado com a túnica presa na escarpa e os animais que o rodeavam não eram propriamente abutres, nem corvos, nem condores, nem águias, nem açores, nem o Pauleta, nem falcões cara-de-moeda, nem pterodáctilos, nem codornizes, nem avestruzes, nem galinhas, nem galos, nem frangos, nem pintos, nem cordilhões, nem papagaios, nem cotovias, nem melros, mas um cuco que para ali voava?
E aquilo foi tudo um bocado empolado pela excitação.
PML
E aquilo foi tudo um bocado empolado pela excitação.
PML
ahahah, gosto muito destes teus posts!
a minha vidinha é assim a uma escalazinha menorzinha...
(sempre senti dificuldade de empatizar com as heroinas das operas, era tudo demasiado, por isso optei por ouvir só a música e ignorar a narrativa exagerada)
Posted by ana | 4:55 da tarde
Também gosto muito destes posts. Por excitação e empolar lembrei-me de um post que fiz para o estrogen para a série Santos da Casa.
Era um excerto das Aulas de Literatura do Vladimir Nabokov.
É que assim que li os teus posts lembrei-me de literatura. Lembrei-me de como tudo são leituras e como o ser tudo um pouco empolado pela excitação é o que distingue a mediania cinzenta de todos os dias da arte e, no limite, dos milagres.
Fica aqui o excerto:
"A literatura não nasceu quando um rapaz a gritar «Lobo! Lobo!» saiu a correr do vale de Neanderthal com um grande lobo na sua peugada: a literatura nasceu quando um rapaz apareceu a gritar «Lobo! Lobo!» e não havia nenhum lobo a persegui-lo. O facto de o pobre diabo, porque mentiu demasiadas vezes, ter acabado por ser comido por uma fera verdadeira é meramente acidental. Mas eis o que é importante. Entre o lobo no meio do capim e o lobo no conto há um difuso mediador. Esse mediador, esse prisma, é a arte da literatura. (…) A magia da arte estava na sombra do lobo que ele deliberadamente inventou, no seu sonho do lobo; depois a história dos seus truques fez uma boa história. Quando finalmente pereceu, a história dele adquiriu as tonalidades de uma boa lição ao redor da fogueira do acampamento. Mas foi ele o pequeno mago. Foi ele o inventor.
Há três pontos de vista segundo os quais um escritor pode ser considerado, pode ser considerado um contador de histórias, um professor e um encantador. Um grande escritor combina os três, mas é o encantador que há nele que predomina e o torna um grande escritor. "
Vladimir Nabokov, Aulas de Literatura, Relógio de Água
Posted by INF | 5:32 da tarde